Dispositivos médicos: desafios em tempos de mudança
Aida Batista
Secção Especializada de Dispositivos Médicos da SPFCS
Os dispositivos médicos constituem uma tecnologia essencial no apoio ao diagnóstico, seguimento e tratamento dos doentes. Desde uma simples agulha até aplicações digitais, eles aumentam a precisão dos tratamentos e tornam outras abordagens terapêuticas mais efetivas e menos invasivas.
Com a entrada em vigor do novo Regulamento dos Dispositivos Médicos (UE) 2017/745, e do Regulamento dos Dispositivos Médicos para Diagnóstico In Vitro (UE) 2017/746, pretende-se assegurar de forma mais robusta a rastreabilidade do seu circuito, através de uma melhoria da vigilância e fiscalização do mercado. Esta legislação também proporciona mais transparência e segurança jurídica para os intervenientes no circuito do dispositivo médico e pretende fortalecer a inovação no setor, com base na melhor evidência disponível.
A primeira edição do Índex Nacional de Acesso aos Dispositivos Médicos, em 2024, refere alguns dados significativos. A perceção sobre as ruturas em 2023 é significativa, com 70% das instituições de saúde a considerá-las graves ou relevantes, sendo que 95% recorre à consignação de dispositivos médicos, atendendo às questões de disponibilidade financeira. Contudo, apenas 37% dos hospitais tem uma comissão responsável por pesquisar alternativas no mercado.
Podemos ainda referir outros indicadores relevantes: apenas 28% dos hospitais do SNS têm sistemas de gestão de dados para desenvolver análises de custo-efetividade e só 17% gerem dados em contexto de vida real. No âmbito da constituição das Unidades Locais de Saúde, com integração de cuidados primários, hospitalares e continuados, tal constitui um desafio de gestão para o sistema de saúde que não deve ser subestimado.
O acesso a dispositivos médicos está assim condicionado, por um lado, pela carga burocrática, mas também pela falta de recursos humanos especializados. Neste âmbito, a diferenciação dos farmacêuticos, que já possuem um perfil de conhecimentos e competências de base muito adequado, torna-se fulcral para garantir o acesso a estas tecnologias de saúde.
Os farmacêuticos podem também, pelo seu saber e experiência adquirida, contribuir para melhorar os critérios de avaliação, priorizando a medição do valor real que os dispositivos médicos trazem para os doentes. Constituem-se também como interlocutores privilegiados para a criação de acordos com a indústria, de modo a garantir mecanismos de partilha de risco e de promoção da inovação, incluindo o investimento em ferramentas de inteligência artificial.
Estamos perante um momento de mudança. Os farmacêuticos estão em excelentes condições para liderar a inovação neste setor, proporcionando oportunidades de melhoria na eficiência do sistema de saúde. São, também, os profissionais mais capacitados para conceber mecanismos que utilizem os resultados dos doentes de modo a otimizar o uso de dispositivos verdadeiramente inovadoras e eficientes, nomeadamente num contexto de generalização da integração de cuidados.
O impacto que os dispositivos médicos possam ter na saúde e bem-estar dos doentes serão a medida de uma prática profissional farmacêutica robusta e inovadora, ao serviço dos cidadãos.
Artigo publicado na Netfarma, disponível AQUI.